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Em Macau "adaptação" é a palavra de ordem

A Cláudia Ferreira estagiou no Banco Nacional Ultramarino em Macau, 2019. Neste post partilha alguns dos aspetos mais desafiantes desse período.
Em Macau "adaptação" é a palavra de ordem

Cláudia Ferreira | Ed. 23 | C19 | Banco Nacional Ultramarino S.A. | Macau, China

Macau é uma das duas regiões administrativas especiais da China, juntamente com Hong Kong. É um dos principais destinos mundiais para os jogos de sorte, atraindo high-rollers e apresentando uma indústria de jogo com lucros superiores a Las Vegas.

Viver em Macau é uma experiência única mas nem sempre fácil. Com uma mistura de culturas, tradições e modernismo, surgem alguns contratempos que muitos de nós não estavam à espera. Inicialmente muitos destes são uma grande barreira, mas esta experiência torna-se gratificante e enriquecedora por termos de aprender a ultrapassá-los.

AS PESSOAS

As pessoas constituem, na minha opinião, o maior choque. Não só os macaenses, como também os chineses mainlanders, no geral, são bastante diferentes de nós. Vinda de um país tão acolhedor como Portugal, tornam-se difíceis os primeiros meses de adaptação em Macau. Não é fácil encontrar muita cortesia ou simpatia. Aqui, as pessoas não respeitam filas, muitas vezes não nos tentam ajudar quando pedimos (possivelmente porque também não nos entendem) e não têm os nossos hábitos de higiene em locais públicos. Penso que este desafio é o mais difícil de ultrapassar pois implica toda uma adaptação a esta nova realidade.

De forma totalmente contrastante e relacionado com um tópico que será abordado mais à frente, o do ambiente profissional, os macaenses da empresa onde estou a estagiar são bastante simpáticos, trazem muitas vezes comida e partilham com todos, com uma notável boa vontade.

COMUNICAÇÃO

Sendo Macau uma antiga colónia portuguesa e, também, uma enorme economia, vinha com a expetativa de a barreira linguística não ser algo muito problemático. No ambiente profissional, o rácio de macaenses ou chineses que dominam o inglês é relativamente elevado, mas no que toca ao dia-a-dia a realidade não é a mesma: uma pequena minoria dos macaenses fala inglês. Desde supermercados a serviços públicos, são muitos os funcionários que não falam nenhuma língua para além de Cantonês, o que complica bastante simples tarefas como pagar uma conta, carregar o telemóvel, enviar um postal ou pedir comida num restaurante.

Uma ferramenta muito útil foi, claro, o Google Tradutor, tanto para mim, como para os macaenses. Por vezes, a comunicação é feita toda à base desta aplicação ou de gestos. Contudo, com mais ou menos complicações, a situação resolve-se sempre!

HABITAÇÃO

Para mim, e não só, arranjar uma casa foi um enorme desafio. Em Macau é necessário contactar um agente para nos mostrar diversas habitações. Vi imensas casas com fracas condições (pouca luz natural, antigas, ...) por um preço na média do mercado, pelo que, arranjar uma casa com boas condições acabou por ficar dispendioso. Adicionalmente, aquando da entrada na casa é necessário pagar 4 rendas: uma de caução para o agente, 2 de depósito da casa (devolvidas no fim) e uma renda para o mês de entrada. Este “investimento” inicial foi um pouco complicado, tendo em conta o preço médio das casas aqui. Para além disso, é um processo um pouco cansativo, ver imensas casas e muitas não cumprirem os padrões a que estamos habituados. Mas, com um pouco de esforço acabei por encontrar uma casa boa, com uma boa localização, embora por um preço um pouco mais alto do que a média.

O TEMPO

Cheguei a Macau em março, pelo que o impacto inicial não foi muito grande. Era abafado e húmido, mas a temperatura estava amena (cerca de 24/25 graus celsius de máxima). No entanto, em maio a temperatura começou a aumentar drasticamente para cerca de 30 graus, com 90% de humidade, que se transforma numa sensação térmica de 40 ou mais. Além disso, a amplitude térmica é muito baixa, pelo que a diferença entre a temperatura máxima e mínima dos dias é raro ultrapassar os 5 graus. Algumas lojas oferecem produtos para ajudar a combater o calor, muito usados pelo povo macaense, como as ventoinhas portáteis e os leques. Tudo isto se altera na altura das monções - em julho e agosto, principalmente, porque chove imenso e costuma haver tufões.

Estas condições meteorológicas favorecem o aparecimento de baratas em algumas zonas da cidade menos movimentadas (ou mais sujas) e é normal que apareçam algumas dentro das habitações (mesmo nas mais limpas e em andares mais altos). Desta forma, torna-se necessário pôr armadilhas ou produtos para as afastar ou matar (e estar pronto para matar uma ou duas!).

PREÇOS E SUPERMERCADOS

Outra coisa um pouco diferente diz respeito aos preços. No início custa dar 1 euro por uma peça de fruta, 1 euro por um brócolo ou 5 euros por cereais mas, na verdade, aqui os ordenados são mais elevados, pelo que é apenas o choque inicial.

Relacionado com compras há também o problema dos supermercados. Aqui parece ser difícil comprar tudo aquilo a que estamos habituados no mesmo local. Alguns produtos não existem em todos os supermercados, pelo que é necessário ir a um específico. Mas, geralmente, o supermercado que tem as coisas mais “raras”, é muito mais caro na generalidade dos produtos. Ou seja, para comprar tudo o que preciso, por vezes, tenho que ir a mais do que um supermercado por terem produtos e preços bastante diferentes. Adicionalmente, muitos supermercados não têm talho ou peixaria, o que causa alguma confusão a um bom português.

AMBIENTE PROFISSIONAL

Em Portugal, muitas vezes os funcionários têm o hábito de almoçar juntos ou de  irem beber café depois do trabalho. De forma contrastante, a maior parte dos macaenses não leva as relações que constroem dentro da empresa para fora desta. Em Macau as relações interpessoais entre Macaenses e Portugueses são das 9h-13h e das 14h30-18h. Isto faz com que as ligações pessoais no ambiente profissional não sejam muito fortes e não haja um sentimento de pertença e união na empresa tão grande como em Portugal.

A solução passa por, ao almoço e depois do trabalho, os estagiários do inov contacto se reunirem e arranjarem atividades para preencher o tempo, como exercício, leitura, cursos de línguas, exposições, etc.

Durante os primeiros meses, a adaptação a todos estes fatores não é fácil. No entanto, é preciso saber lidar com os ciclos emocionais (ou aprender) e ultrapassar os obstáculos. Todos os países apresentam o seu próprio leque de desafios (até Portugal) e é esta vivência nas adversidades que, sem dúvida, nos vai trazer uma das melhores experiências da nossa vida.