Crónica das minhas primeiras horas em Casablanca

A despedida no aeroporto foi uma desgraça mas, no avião, até
dormi um bocadinho - tenho tendência para o fazer quando estou nervoso. Comi
um pouco do glúten (sou celíaco, mas posso comer uma pizza de vez em quando)
e achei o iogurte de pistacho suave. Aterrei. Havia setas no chão, não tive
de andar de autocarro, não cheirei nada nem senti humidade ou vento. Tinham-me
dito que era possível que me dessem, dentro do avião, um formulário para
entregar no controlo de passaportes, mas isso não aconteceu. Fui para a fila,
liguei o wi-fi e
falei com entes queridos, como se tivesse passado mais do que hora e meia. Ok, a pessoa que me ia buscar não viu as minhas mensagens no zapzap. Algumas pessoas
perguntaram-me se queria um táxi e toda a gente percebeu que estava fora de água. Estava
sol, tal como em Lisboa. Havia mais palmeiras e hujub. O ar era agradável. Mais adiante vi
eucaliptos e reparei que a terra é apenas um pouco mais vermelha do que em
Portugal. Não foi difícil encontrar o hotel, ao contrário do que dizia
uma crítica online.
Eram cerca de três da tarde. Entrei e perguntei se falavam inglês.
Disseram-me que não, mas chamaram um rapaz – mais jovem que eu – que estava
no sofá, que me disse que apreciava o Cristiano Ronaldo e que estava tudo
tratado. Depois, pôs as malas num elevador e subi com ele. Pareceu surpreso
por eu o ajudar com a bagagem. Era um hotel pequeno, mas asseado, decorado de
forma semi-moderna, zero marroquina e pertíssimo do centro. Saí pouco depois, precisava de comprar champô e mais algumas
coisas que decidi não trazer por poder encontrá-las em qualquer supermercado.
Nas minhas costas, talvez a quinhentos metros, estava uma catedral que já
sabia estar fechada desde a independência. Levantei cem dirhams e fui ao
minimercado mais próximo. Não tinha o que procurava, peguei numa garrafa de
água, o senhor atrás do balcão perguntou-me se não tinha moedas e sorriu,
dizendo que não tinha troco. Fui visitar a praça que nas imediações. Vi muitos pombos, uma
fonte a funcionar com cheiro a cloro, pessoas sentadas em bancos de pedra ou
procurando sombras. A praça estava cercada por edifícios estatais, imponentes
e delicados como, de resto, a generalidade da arquitetura islâmica. Segui para o parque da Liga Árabe, mesmo ao lado. As árvores
eram razoavelmente grandes, mas sem dúvida, recentes. Passei um portão em
ferro e vi que o chão é parecido com o de Serralves. No hotel, explorei os canais na TV e saí para jantar. Vi
diversos sítios com frango a assar num aparelho alto, com várias barras
horizontais, e outra carne, num mostrador. Escolhi um, que tinha duas mesas
no passeio. Uma rapariga simpática trouxe-me o menu. Depois de escolher
trouxe-me a entrada que, vim a saber, é afinal uma sobremesa. Soube-me muito
bem, tanto o gesto acolhedor, como o doce em si. Mas, por azar, a carne que
escolhi estava um tanto picante. Fui dormir: «amanhã tenho mais tempo» pensei. |