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Vim para o Brasil fazer o que nunca imaginei, (re)aprender a falar português

Vim para o Brasil fazer o que nunca imaginei, (re)aprender a falar português

Quando me candidatei ao INOV Contacto, umas das coisas que deixei bem claras na entrevista, foi o facto de querer ir para um país fora da Europa, em que houvesse um grande choque cultural, que contemplasse também a questão linguística. Gosto de desafios, adoro aprender novas línguas e desde o início encarei toda esta viagem como tal. No dia 22 de Fevereiro, quando anunciaram o meu destino, fiquei super feliz por ter sido colocada no Brasil. Pensei logo: “América do Sul, calor, aquelas praias incríveis, só pode correr bem!”.

Depois deste pico de adrenalina, o entusiasmo começou a descer. Comecei a   pensar que o choque cultural seria inexistente, iria falar português durante todo o estágio e, apesar de o Brasil ser um país da América do Sul, era parecido com Portugal devido às influências da colonização. Mal eu sabia o quão errada estava.

No início senti-me muito frustrada. Falava com as pessoas, ia às lojas, cafés, restaurantes e ninguém me entendia. Sim, exatamente, ninguém me entendia. Cheguei ao ponto de ter de  apontar para o que queria. Respondiam-me em espanhol ou inglês, quando não me ignoravam. Mal abria a boca perguntavam-me: “Argentina?” Isto irritava-me. “Como é que não me entendem, se falamos a mesma língua?” pensava eu. Afinal, contra tudo o que esperava, ser compreendida acabou por ser um dos meus maiores desafios no Brasil.

Cheguei à conclusão de que, para os paulistanos é mais complicado entender-nos, devido à sonoridade e abertura do nosso sotaque. Temos sempre de tentar fazer um sotaque meio "abrasileirado" e falar devagar para nos perceberem. O sotaque carioca é mais aberto, mais claro e todos nos percebemos melhor.

Depois de desvendado o enigma dos sotaques, veio o enigma das palavras e a variedade de coisas que eles dizem de forma diferente de nós. Chamam mixer à varinha mágica e camisolaa uma camisa de dormir. Passei dias a referir-me às mulheres como raparigas, quando me apercebi de que aqui significa prostituta (eu bem estranhava a reação das pessoas). No supermercado perguntava por presunto e davam-me fiambre.

Esta história poderia ser sobre imensa coisa. Poderia falar da disparidade económica e social que existe,  da simpatia e hospitalidade do brasileiro, da variedade de climas que o país tem, da comida, ou da ideia formatada que eles têm dos portugueses e das estranhas piadas que fazem sobre isso (o português está para o brasileiro assim como o alentejano está para o nortenho), mas decidi falar da barreira linguística, pois quando pensamos no Brasil não nos lembramos desta questão, mas, de facto, ela existe. Vim para o Brasil fazer o que nunca imaginei, (re) aprender a falar português.

Imagem: Soraia na costa de São Paulo